Sustos curam soluços?

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Ciência em Portugal #1: Entrevista a Vítor Cardoso

Um dos objectivos iniciais do nosso projecto era divulgar o trabalho de cientistas portugueses no nosso país e no mundo, bem como ter conhecimento das suas experiências profissionais.
Assim, começamos hoje, com este post, a publicar algumas questões que fizemos a cientistas portugueses que se tenham distinguido.

O nosso primeiro entrevistado é Vítor Cardosoinvestigador do Departamento de Física do Instituto Superior Técnico, vencedor do Prémio Gulbenkian de Ciência em 2002 e 2005, do Prémio para Jovens Investigadores UTL/ Caixa Geral de Depósitos em 2008, e de uma bolsa Fulbright na Universidade do Mississippi em 2008/2009.
Queríamos, desde já, e mais uma vez, agradecer a sua disponibilidade e colaboração no nosso projecto.

  

1.    Em que universidade estudou? Acha que isso influenciou a obtenção do seu primeiro emprego?

Estudei no Instituto Superior Técnico, da Universidade Técnica de Lisboa. A minha opinião é que influenciou (na positiva) fortemente a minha competitividade a nível internacional, mas não penso nunca em termos de primeiro emprego.
Estudar numa boa universidade, exigente e com docentes de qualidade é um passo fundamental para estarem no topo quando acabarem o curso ou doutoramento. Mas o outro passo cabe à pessoa: trabalho, dedicação, dinamismo e vontade de chegar mais além.


2. Temos conhecimento de que passou algum tempo nos EUA a estudar e a desenvolver projectos. O que achou da sua experiência?

Fiz a licenciatura e doutoramento no IST, primeiro pós-doutoramento em Coimbra, segundo na Washington University em St.Louis, terceiro na Universidade do Mississippi. Adorei a estadia nos EUA. Primeiro porque aprendi que existem outros povos com outra forma de ver a vida, outro tipo de motivações e outro tipo de à vontade no Mundo. Para mim foi fundamental perceber que se pode levantar a cabeça e pensar que o mundo também é meu. Os EUA têm coisas magníficas e outras nem tanto, mas foi (e ainda é) bom ver a diferença. Além disso, os americanos premeiam muito o esforço, o dinamismo, e isso é muito motivador.


3.    Acha que o nosso país apoia suficientemente os jovens cientistas e/ou se tem potencial para competir com países mais desenvolvidos?

Completamente. O nosso país é dos que apoiam mais os jovens cientistas, pelo menos nos últimos 10-15 anos tem sido assim. Ainda não podemos competir com muitos países, mas isso é porque temos um atraso histórico que estamos lentamente a recuperar. Não sei como a situação vai estar daqui a 10 anos, mas se continuarmos com esta aposta, posso garantir que estaremos melhor que muitos dos nossos colegas na Europa.
Mas eu queria também alertar para o facto de que o Mundo se alargou: Portugal é Europa e é o Mundo, portanto não têm necessariamente que ficar cá a trabalhar. Um Francês também não tem que ficar em França a trabalhar, pode fazê-lo em Portugal. Não é uma tragédia não conseguirem o emprego ideal em Portugal, pelo contrário, é uma oportunidade para verem outros povos e outras realidades. E o mesmo para qualquer cidadão de outro país.


4.    O seu mérito já foi reconhecido por várias vezes, pelo que o podemos considerar uma referência. Na sua opinião, o que é preciso para ser um profissional de sucesso na sua área?

Dedicação, persistência, e sorte. A investigação científica neste aspecto é equivalente a qualquer trabalho criativo, seja ele a escrita, a música, a arte, etc. É, e sempre foi, um trabalho solitário na maior parte das vezes. Pode durar anos até resolvermos um problema ou acharmos que compreendemos o problema. A maior parte das vezes, investigação é uma luta com nós mesmos, ver até que ponto conseguimos pensar no problema sem desistirmos, ou entender o cerne do problema de uma forma original, etc. Pelo caminho, vamos percebendo as nossas fraquezas, o que não é nada agradável, mas vamos também percebendo o que temos de bom. E pelo menos no início não é fácil, porque existem problemas que parecem mais duros que nós. Creio que ao fim de uns anos a tentar realmente superarmo-nos, surge o momento mágico em que atingimos um "estado de graça": fazemos o que gostamos, quando queremos e estamos a dar novos mundos a conhecer à sociedade e a nós mesmos. É comum trabalhar sete dias por semana, 24 horas por dia, 365 dias por ano, mas porque gostamos, porque é impossível "desligar". 


5.    É habitual divulgar a sua experiência em escolas ou universidades?

Nem por isso. É mais habitual divulgar o meu trabalho científico em Universidades ou conferências.


6.    Encontra-se actualmente a desenvolver algum novo projecto?

Sim, sempre. Neste momento estou empenhado em dois projectos de longa duração: o primeiro consiste em entender o que acontece se a teoria de Einstein sofrer algumas correcções. Isto é, quais as consequências, como é que poderemos ter efeitos observacionais de tais alterações. O segundo projecto, começado há algum tempo, é entender como é que buracos negros se comportam em situações de grande violência, por exemplo quando chocam uns com outros, etc.


7.    Enquanto alunos que somos, temos escolhas e decisões para fazer acerca do nosso futuro. Que opinião e conselhos nos pode dar quanto a seguir uma área das ciências ou enveredar pelo mesmo curso que escolheu?

Eu sou muito mau a dar conselhos! A minha opinião mais sincera é: escolham o que gostam, independentemente do que acham que vai ter saída. Tudo tem saída se se esforçarem o suficiente. Se tiverem talento, trabalhem-no ainda mais: o que quer que vão fazer com ele depende 90% de trabalho árduo, dedicação e ambição, e apenas 10% desse talento. E finalmente, sejam felizes! Não há nada pior na vida que uma pessoa carrancuda.


8.    Sente-se realizado profissionalmente?

Adoro o que faço, mas quero continuar a fazer e espero pelo menos compreender mais algumas coisas sobre o funcionamento do Mundo.



1 comentário:

  1. Parabéns Vitor, eu mesmo quero ser Físico quem saiba algum dia eu estude as tuas descobertas.

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